top of page
Buscar

Investigação defensiva nos crimes de competência do Tribunal do Júri

Foto do escritor: Andrey MoreiraAndrey Moreira

Inicialmente, importa informar que, com o presente texto, não se pretende esgotar a discussão acerca da investigação defensiva, uma vez que o tema é extremamente inovador, comportando uma infinidade de estudos e debates mais aprofundados, de modo que iremos nos ater à sua importância em relação aos casos de competência Tribunal do Júri.


Regulamentada recentemente pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, a investigação criminal defensiva, ou investigação interna, encontra sua definição técnica no artigo 1º do Provimento nº 188/2018 do CFOAB, o qual prevê que:

compreende-se por investigação defensiva o complexo de atividades de natureza investigatória desenvolvido pelo advogado, com ou sem assistência de consultor técnico ou outros profissionais legalmente habilitados, em qualquer fase da persecução penal, procedimento ou grau de jurisdição, visando à obtenção de elementos de prova destinados à constituição de acervo probatório lícito, para a tutela de direitos de seu constituinte.

Sendo assim, o advogado poderá instaurar a investigação interna a qualquer momento da instrução criminal ou da fase recursal, bem como durante a investigação preliminar, buscando elementos para o trancamento ou instauração de inquérito policial, ou, ainda, após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, visando obter elementos para a propositura da revisão criminal ou no decorrer desta, como de extrai dos artigos 2º e 3º do supramencionado Provimento.


No que tange ao Tribunal do Júri, embora seja assunto recorrentemente discutido e trabalhado neste Canal, que conta com ótimas publicações sobre o tema, algumas considerações básicas serão necessárias para fins didáticos e de contextualização, sem, contudo, aprofundar a discussão neste ponto.


Sendo assim, importa referir que o instituto do Tribunal do Povo é previsto como direito e garantia fundamental por força do artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal de 1988, destinando-se a julgar os crimes dolosos contra a vida, e tendo procedimento bifásico ou escalonado, uma vez que se divide em duas fases, sendo a primeira denominada judicium accusationis e a segunda judicium causae.


Por judicium accusationis, compreende-se a fase inicial do procedimento, também denominada sumário de culpa, que se inicia a partir do recebimento da denúncia ou da queixa, onde a acusação buscará apresentar evidências de materialidade e de autoria ou participação suficientes a ensejar o pronunciamento do acusado, na forma do artigo 413 do Código de Processo Penal, não havendo falar em condenação nesse momento.


Aqui, conforme previsão do artigo 414, do Código de Processo Penal, caso não se convença da existência de materialidade ou de indícios suficientes de autoria ou de participação, o magistrado impronunciará o acusado fundamentadamente, podendo ocorrer, ainda, a desclassificação (art. 419 do CPP) ou absolvição sumária do acusado (art. 415 do CPP).


A segunda fase – judicium causae -, por sua vez, tem início com a sentença de pronúncia e engloba toda a preparação para o Plenário, quando acusação e defesa serão intimadas para, desejando, arrolar testemunhas – no limite de 5 (cinco) -, juntar documentos e/ou requeirer a produção das diligências que entenderem necessárias, nos moldes do artigo 422 do Código de Processo Penal, encerrando-se esta etapa com o efetivo julgamento pelos seus pares. 


Aqui, importa mencionar que, no julgamento em Plenário, ergue-se para o réu a plenitude de defesa – que não se confunde com a ampla defesa -, podendo o defensor alegar e valer-se de todos os meios de defesa possíveis e necessários para o convencimento dos jurados, desde que junte os documentos que pretende utilizar no julgamento até três dias antes da sessão plenária.


Assim sendo, tendo em vista esta divisão do procedimento, o advogado deverá diligenciar e utilizar a investigação defensiva incessantemente para produção probatória desde o primeiro momento em que for constituído, podendo se valer destes elementos de prova ao longo de toda instrução criminal, bem como em eventual julgamento pelo Conselho de Sentença ou, ainda, após o trânsito em julgado da decisão, visando à obtenção de novos elementos para a propositura da revisão criminal.


Afinal, como referido anteriormente, a investigação interna poderá ser aplicada em qualquer instante da instrução penal, durante a investigação preliminar e após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, de modo que diversas são as hipóteses e circunstâncias em que o advogado poderá agir na produção de provas para tutelar os direitos do seu constituinte.


Contudo, seguindo o que é mais corriqueiro na rotina da advocacia criminal, neste texto adotaremos a premissa de que o advogado criminalista foi contratado a partir da citação do réu para oferta da resposta à acusação, na primeira fase do procedimento.


Partindo deste ponto, na fase inicial o defensor constituído deverá pensar o uso da investigação criminal visando, simultaneamente, à produção de elementos probatórios que levem ao não recebimento da denúncia – logo após o oferecimento da resposta à acusação -, bem como à preparação de um rol de testemunhas e de um acervo probatório robusto que proporcione a elaboração da tese defensiva que será utilizada em sede de alegações finais.


Ou seja, caberá à defesa técnica ser altamente proativa e diligente, buscando, em conjunto com o acusado, mesmo que isto demande visitas diárias ao parlatório da casa prisional, refletir sobre possíveis testemunhas, álibis e elementos probatórios que possam fomentar a absolvição ou a impronúncia, bem como possam ser aplicadas em eventual julgamento em Plenário, haja vista que essas provas permanecerão nos autos e poderão ser aplicadas na explanação defensiva perante os jurados. 


No caso de existência de possíveis testemunhas, estas poderão ser convidadas pelo defensor – e aqui não se fala em intimação -, por meio de notificação extrajudicial para que compareçam ao seu escritório e relatem o que conhecem sobre os fatos, sendo que este convite, por óbvio, deverá seguir os ditames ético-legais, facultando-se sempre que o depoente esteja acompanhado dos seus advogados. 


Além disso, é de suma importância que o advogado faça a ata do encontro e o termo de consentimento, referindo que a testemunha foi convidada e compareceu de livre e espontânea vontade ao escritório, sendo que a colheita do depoimento deverá ser gravada na sua integralidade, evitando-se qualquer corte no vídeo, de modo que, caso o depoente queira beber água ou ir ao sanitário, este o fará enquanto a gravação seguirá sem interrupções.


Ademais, para fins exemplificativos, o advogado também poderá se valer de imagens de câmeras de segurança ou do sinal de antenas de telefonia móvel, que, por meio do geoposicionamento (GPS), possam demonstrar a impossibilidade de o acusado estar no local dos fatos quando da ocorrência do delito. 


Aqui, tal qual ocorre com outras modalidades de diligências mais complexas, será necessário requerer ao magistrado que este oficie aos órgãos públicos responsáveis pelas imagens – caso de câmeras administradas pela Secretaria de Segurança Pública dos Estados ou Departamentos de Trânsito dos Municípios – ou às operadoras de telefonia móvel que detenham os registros da linha telefônica e da localização daquele aparelho.


Entretanto, cabe alertar que, em tempos de aviltamento e criminalização da advocacia criminal, como forma de se precaução, é de extrema importância que antes de dar início a qualquer ato investigatório o advogado informe à OAB que pretende instaurar uma investigação interna, comunicação esta que deverá ser protocolada diretamente na seccional, sendo que a cópia protocolada deste informativo e a eventual resposta vinda da Ordem deverão ser juntada no caderno investigatório interno.


Por caderno investigatório interno compreende-se a pasta formada pelo advogado, onde aportarão as provas produzidas com a investigação interna, a qual segue os moldes de um inquérito policiais tradicional, contendo capa com o número de autuação do processo judicial e dos atos administrativos que deram origem ao processo, bem como todos os elementos necessários à identificação e individualização desta investigação.


Além do mais, outras diversas diligências de alta complexidade poderão ser realizadas pelo advogado com a devida assistência de profissionais técnicos privados, de maneira que é recomendável ao defensor fazer uma reserva no contrato de honorários destinada à eventual contratação destes consultores técnicos, os quais poderão produzir laudos capazes de confrontar às perícias oficiais ou de supri-las, em caso de inexistência destas.


Ou seja, a investigação criminal defensiva se consolida como verdadeiro meio de equiparação de armas e mitigação dos danos cognitivos em relação ao julgamento futuro, principalmente em relação aos delitos de competência do Tribunal do Júri, onde o rege o “principio” in dubio pro societate e a decisão final será dos membros da sociedade, geralmente leigos, de modo a proporcionar ao defensor uma maior capacidade argumentativa e de trabalho.


Desta forma, diante das penas elevadas decorrentes de uma condenação originaria do Tribunal do Júri e da extrema complexidade dos casos que a ele são submetidos, não restam dúvidas acerca da imprescindibilidade da investigação criminal, de modo que o defensor deverá diligenciar incansavelmente para produzir provas capazes de contrapor àquelas produzidas pela acusação e que lhe permitam, em último caso, exercer com efetividade a plenitude de defesa.


Leia no Canal Ciências Criminais.



15 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page